E não, isto não é uma resenha.
Então, sim, sou um fã de Jojo's Bizarre Adventures..Acho que aqui é a parte onde eu deveria elaborar um pouco mais sobre o porquê disso: o modo como ela reúne a quantidade certa de bizarrice, histórias estapafúrdias, poderes estapafúrdios. Ou sobre como ela é aquele tipo de história onde o autor tem a liberdade de fazer o que quiser, como quiser e porque quis.
Mas hoje, não estou aqui para falar sobre Jojo, mas para falar de uma das coisas que mais me pegou nessa Parte 4, a cidade de Morioh.
Para quem ainda não assistiu - ou para quem não vai assistir de forma alguma - Morioh é a cidade onde se passam as aventuras de Josuke Higashikata protagonista de Diamond is Unbreakable, a quarta parte da série Jojo ´s Bizarre Adventures. Mas mais do que apenas um simples pano de fundo para a história, a cidade termina sendo um personagem em si.
Parte desse papel vem, sem sombra de dúvidas, da direção de arte do próprio anime, que, tomando por base a mudança no estilo de arte de Hirohiko Araki ( cirador do mangá), garantiu uma personalidade única para a cidade com sua paleta de cores fortes e curiosas, cirando uma cidade psicodélica de céus cor de laranja e ruas verdes.
Mas mais importante do que a decisão estética em si, Morioh ganha destaque por possuir um aspecto extremamente funcional para a história. Diferente das partes 1-3, a parte 4 de Jojo apresenta uma grande mudança em termos de escopo narrativo. Enquanto os arcos de Jonathan, Josef e Jotaro apresentam jornadas épicas para combater um grande mal que ameaçava o mundo, o arco de Josuke possuí um foco menor, sendo construído em torno do cotidiano da pequena cidade e seus habitantes. sendo o mal e o horror nela presentes também associados aos horrores do dia-a-dia que se escondem por trás do véu da rotina. Assim, Morioh deixa de ser apenas um pano de fundo para a história e passa a ser a própria base da narrativa.
Como se esses dois pontos não fossem suficientes, há também um terceiro, que é o fato de novos aspectos da cidade serem apresentados a cada episódio, de modo que a própria Morioh vai crescendo e se desenvolvendo junto com os protagonistas e antagonistas da série – algo que é reforçado pelas apresentações dos Pontos Turísticos de Morioh, uma série de locais cuja história vai sendo apresentada ou expandida ao longo da série, sempre se relacionando com a narrativa de Josuke.
Esses 3 pontos já seriam o suficiente para si só, uma vez que o processo de dar vida a um local - ainda mais nesse nível de vida - não é uma tarefa fácil. Mas no caso de Morioh, um outro elemento terminou chamando a minha atenção, e acredito que foi esse um dos motivos pelos quais eu gostei tanto de Diamond is Unbreakable.
E esse elemento é o de familiaridade.
Mas o que raios seria isso, você pergunta? Bem, certamente há um termo apropriado para isso, mas não consigo lembrar exatamente qual é. Além disso, o objetivo desse texto é ser mais leve e despretensioso, não um artigo formal. Assim, para deixar esse texto o mais simples possível, chamarei esse efeito de familiaridade.
A familiaridade seria uma sensação de reconhecimento - e, portanto, de ser familiar - que algumas situações, dilemas ou locais trazem em narrativas. Você certamente já deve ter passado por algo. Imagine aquela leitura, ou aquele filme, em que, em dado momento da história, um personagem se viu diante de uma situação X que, de algum modo, fez com que você se lembrasse de sua própria experiência, guardas as devidas proporções. Seja o nervosismo que você sentiu ao se declarar para alguém, seja a raiva de alguma injustiça sofrida, seja a ansiedade de uma escolha, enfim, qualquer emoção do vasto leque que compõe a experiência humana. A arte, de forma geral, é bem propensa em criar essa sensação com o leitor/espectador, sendo muitas vezes um espelho para nossa realidade.
E foi essa sensação que tive ao conhecer a pequena cidade de Morioh.
Tendo nascido e crescido em uma cidade pequena - em termos de uma capital -, ver Morioh foi uma experiência curiosa e divertida. Na verdade, a sensação mais próxima que poderia usar para definir esse passeio é o de um reencontro de um velho amigo. Mesmo afastado por muitos e muitos anos, ainda temos a memória dos tempos passados juntos, assim como uma familiaridade com seus gostos e peculiaridades.
Tendo sido inspirada na cidade natal de Araki, Sendai, muitas das características do pano de fundo da parte 4 de Jojo's Bizarre Adventures são aquelas de uma cidade pequena, com seus pontos de encontro, marcos históricos e culturais sendo um espelho de suas contrapartes no mundo real.
Assim, encontrar Morioh foi como encontrar minha própria cidade, guardando-se, é claro, às devidas proporções, revivendo aquele diálogo entre Marco Polo e Kublai Khan em As Cidades Invisíveis, de Ítalo Calvino. onde o grande imperador pergunta o porquê do viajante nunca falar sobre sua terra natal, ao que Marco responde que, ao descrever as outras terras, ele estava, na verdade, descrevendo a sua Veneza.
Então, se um dia tiver a chance de visitar essa pequena, barulhenta e bizarra cidade de Morioh, recomendo que tirem um dia ou dois para conhecê-la. Quem sabe, você pode terminar encontrando nela a sua própria cidade.
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